A Marca

Foto: Mariana Bruno

Para os jovens estilistas que almejam abrir uma marca própria, os desafios de manter esse negócio podem ser significativos. Em 27 de abril de 2024, a criadora de conteúdo digital de 21 anos, Giovana Crosara – que no momento tinha apenas 20 anos – abriu sua marca de roupas, a GIC. Inspirada em seu nome, a uberlandense foi de estudante do último ano do Ensino Médio para uma empresária em um curto período de tempo. 

Apesar de ser um fator comum o sonho de seguir na carreira de moda, o desafio também é outro denominador semelhante. Depois de 4 meses da abertura de sua marca, Giovana já se diz cansada.

“No Brasil, o mercado da moda é muito difícil, tenho várias amigas que compartilham esse pensamento. Tudo no Brasil é mais caro e os impostos são maiores”.

O estudo realizado em 2022 pela plataforma de inteligência de vendas Cortex, diz que o setor de comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios liderou a abertura de negócios no Brasil. Assim, em um mercado com tanta competitividade, como os jovens – iniciantes do mercado e sem uma experiência vasta na indústria – podem sobreviver? 

Criador da marca afrodescendente e afroindígena, a Berimbau Brasil, o estilista e empreendedor de 29 anos Sandro Freitas comenta sobre o processo que percorreu para a abertura de seu negócio. “Era bem difícil. As primeiras pessoas que consumiam meu produto eram mais amigos, foi um momento bem delicado porque eu tinha que gerar essa renda e, ao mesmo tempo, tinha um trabalho em paralelo. Foi complicado conciliar uma coisa com a outra”.

Nascido no Maranhão, Sandro viajou para São Paulo aos 15 anos, se formou no Ensino Médio, engatou no curso de Moda, Estilismo e Coordenação no Senac e hoje consegue contar o processo para a abertura de sua marca.

“É um desafio muito grande. Quando falamos em criar uma empresa, o formato padrão é ter um investidor, um plano de negócio e uma receita padrão. Aí, quando viramos para os jovens, com novas vivências e ferramentas, a gente tem uma perspectiva diferente de algo que, para as pessoas, existia apenas um caminho. Quando criei a Berimbau, não tinha muito investimento e recurso, na verdade, comecei pensando no conceito que eu queria. A partir do momento em que eu fui me fortalecendo, comecei a pensar nos produtos que eu ia oferecer e como eu ia oferecê-los, busquei ferramentas para automatizar o meu sistema, gestão e a administração da minha marca. Nesse momento, procurei o Sebrae e depois fui atrás de consultores. Então, primeiro veio a parte conceitual para depois se tornar o produto”.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revelou que o número de jovens, até 30 anos, que entraram no empreendedorismo cresceu em 15%. Hoje, a Berimbau Brasil é a única marca maranhense presente em uma semana de moda, a Casa de Criadores de São Paulo. “É uma realização muito grande, um sentimento imensurável, que divide um pouco de felicidade e às vezes um pouco de insegurança, porque a gente sabe que o mundo da moda é muito efêmero, então as marcas têm um prazo de validade”. Mas para os estilistas que ainda não alcançaram o reconhecimento, o mercado é ainda mais desafiador. A estudante de estilismo Kiara Valentine, de 19 anos, revela os obstáculos que enfrenta por ser uma menina trans e de baixa renda no mercado.

“Se eu falar que consigo me sustentar com o que faço, seria mentira, não consigo. Estou morando com a minha mãe agora, mas morro de medo de ser expulsa de casa, porque já aconteceram episódios assim”.

Foto: Mariana Bruno

Para Kiara acessar o seu curso, o cartão de ônibus da sua avó é fundamental, caso contrário não poderia chegar até a unidade do Senac em São Bernardo do Campo.

“Querendo ou não, a gente precisa desses acessos e não existem políticas públicas que ajudem a gente a chegar nesses lugares. Tipo, eu tenho a bolsa [no curso], mas como pessoas como eu chegam até lá? Uma hora eu vou ter que devolver o cartão para a minha avó, e como vou para o curso se eu não consigo arranjar emprego porque eu sou travesti e as pessoas não contratam?”

Entre o emprego e o desemprego, Kiara conta com uma renda extra, o upcycling. A técnica, que consiste no reaproveitamento de materiais têxteis, acompanha a estudante há um bom tempo, mas não é o suficiente para o seu sustento. “Em encomendas com o upcycling, eu dou o meu preço e as pessoas não querem, então eu acabo fazendo um preço menor para ter um lucro. No final, pago mais para trabalhar do que recebo”. Apesar disso, não deixa de reforçar o seu amor pela indústria:

“Artista é isso, né? É comer pão, nem isso, é comer bolacha de água e sal, mas entregar um belo look”, conclui a estilista.

Quando falamos sobre moda, a palavra “sonho” acompanha a fala desses jovens. Porém, seria este desejo e admiração pela indústria o suficiente para vencer os desafios? De acordo com os dados divulgados em 2024 pelo Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), as micro, pequenas e médias empresas de moda representam 97,5% dos CNPJ ativos dentro desse mercado. Apesar dos números, a jovem estilista Giovana Crosara fala sobre os desafios em sua trajetória como iniciante nesse meio:

“Acho que a grande maioria das marcas começa assim, principalmente pelo fato de que tudo custa, então para você ter um time é caro e uma marca pequena não consegue sustentar uma equipe. Mas o começo de qualquer empreendedor é um “eupreendedor”, ou seja, eu que faço tudo”. 

O fundador da 011 Haus, Felipe Freitas, de 24 anos, cuida tanto da parte criativa quanto das mídias de sua marca, que atualmente passa por um rebranding – termo utilizado para quando uma marca está mudando sua identidade visual e foco. Além de administrar a própria empresa, o estilista também atua como diretor criativo da Hale, uma marca iniciante no mercado. Ao se dividir entre os dois processos criativos, sua fonte de renda está nos trabalhos da 011 Haus, na Hale e em seus investimentos.